Hum?
Oi, sou eu,
pode falar? Quem? Eu, Sandra. Precisava falar com você sabe? Sobre a nossa
história? Olha, eu sei que você não me prometeu nada, que a gente tinha
combinado não se envolver, que era só um caso, umas trepadas e olhe lá, mas eu
também sei, sinto cara, que rola algo entre a gente mais forte, eu tenho
pensado muito nisso, não consigo dormir mais, só sei que a gente tem que dar
uma chance pra esse nosso rolo, caso, romance, amizade colorida, sei lá como
chama isso de trepar, dormir junto, beber, amanhecer e tomar café, tem algo aí,
tem algo que você não quer admitir por medo, muitas porradas que já levou, eu
compreendo, mas a gente tem que tentar de novo, não pode esmorecer, eu tô
fazendo a minha parte sabe, eu acho que a gente tem tudo pra dar certo, amigos
em comum, afinidades, cê não acha?
Huumm?
Alô? Alô?
Cê tá aí? Eu te acordei é? Foi mal, mas a gente não pode deixar pra depois isso
né? Cara, amor quando se encontra tem que correr atrás, bater na porta, fazer
por onde. Eu não vou fingir que eu não sinto nada, que não é comigo, que não
gosto de você. Porra, eu gosto pra caralho. É difícil a gente encontrar alguém
assim tão compreensivo, tão amigo e que fode bem, que me come gostoso, não é
fácil não, é raro, por isso eu tô ligando, pra você pensar melhor, eu sei que a
gente combinou diferente, que você saiu de um relacionamento que a pessoa te
cobrava horrores, que te sufocava, que não deixava você ter a sua liberdade,
deve ser horrível isso mesmo, mas não é cobrança, não leva a mal não, é só um
toque, de amiga mesmo, que te quer feliz, se possível ao meu lado, lógico,
porque eu já te conheço, já sei de cor e salteado o que você precisa numa
mulher, você sabe do que eu tô falando, não?
Huuummmm?
Olha, eu
pensei melhor e acho bom a gente não ficar falando pelo telefone. Gasta impulso
e é impessoal, confunde as coisas. Eu tô indo pra aí, tá? Cê não tá acompanhado
não né? Não, claro que não, se não já teria desligado. Eu tô de carro, vou
rapidinho. Sabe o que eu lembrei noutro dia? Da gente ouvindo pagode às quatro
naquele inferninho em Copa. Lembra? Você disse que eu era especial porque
topava tudo, sem grilos, sem querer nada em troca. E me beijou. Tocava uma
música do Só Pra Contrariar. O que é que eu vou fazer com essa tal liberdade,
pra onde quer que eu olhe lembro de você... Ai, achei tão lindo e tão
significativo tudo aquilo. O pagode, as cervejas na mesa, sardinha frita e o Só
Pra Contrariar de fundo. Foi uma premunição quase. Eu pensei, esse cara tá
frito. A liberdade dele agora sou eu. Outro beijo e você me comeu ali mesmo no
banheiro do bar. Puta, foi do caralho. Eu tava tão molhada, tão apaixonada que
nem liguei pro cheiro de mijo, pros papéis higiênicos sujos no chão, era tudo
perfume sabia? Com você era tudo perfume. Eu quero aquele clima de volta entre
a gente. Eu sei que a gente pode resgatar a beleza cristalina do começo. Viu?
Tô até citando Guilherme Arantes. Então, que tal a gente ir agora lá pro
inferninho. Tá aberto. Hoje é sábado. A gente fode no banheiro e bota na máquina
outro pagode. Então, topa? Tô indo pra aí. Ah, vamos, levanta, toma um banho,
lava a cara, fica bem bunitinho pra mim que eu vou fazer tudo o que você quiser
hoje. É um recomeço cara, uma nova vida pra mim e você. Você ainda vai me
agradecer por tudo isso. Oi? Tá me ouvindo né? Você não acha que a gente ainda
tem alguma chance?
Hummm...
Ei, você tá
meio frio hoje. Meio distante. Aconteceu alguma coisa? Aquela depressão né? Tá
tomando o Citalopram? Não me diga que tomou Lioram pra dormir. Não, você não
tem receita, essa eu não te arrumei. Que mulher vai conseguir receitas de todas
as suas drogas, sem te questionar, sem te chamar de drogado e fazer um
discurso, hein? Só eu querido, sabe porquê? Quer saber mesmo? Porque eu te amo.
Pronto, falei. Te amo mesmo. Te amo, te amo, te amo. Não tenho vergonha de
dizer porque sou muito verdadeira, muito íntegra com os meus sentimentos e não
gosto de ficar guardando as coisas. Depois a gente tem um infarto e não sabe
porquê. Muita coisa acumulada. Você tem que se cuidar, sabia? Não diz as coisas
que sente, fica acumulando muita coisa no peito, depois só um cateterismo. Uma
amiga minha sofreu anos por um sujeito, depois teve uma parada cardíaca e ficou
torta. Ou seja, perdeu o sujeito de vez que o cara nem olhava mais pra ela
torta do jeito que ficou. Captou a mensagem? Você tem que começar a aprender a
falar, a dizer se passa nessa cabecinha oca. Comigo você pode se abrir. Eu sei
que você odeia mulher analista, metida a psicóloga, mas meu querido eu fiz nove
anos de psicanálise Freudiana, Lacaniana, Reichiana, alguma coisa eu devo ter
aprendido. Eu sei ouvir querido. E não vou te julgar não, pode ficar tranqüilo.
Sei que tudo começou com aquela vaca que você foi casado. É isso, tem mulher
que destrói o homem, que não dá valor ao homem que tem. Uma burra tua ex,
sabia? Uma idiota completa. Desculpe, mas só tenho esse adjetivo pra uma mulher
que larga um cara como você. Como é que não percebe o homem que tem nas mãos? É
por isso que eu acho que a gente tem tudo pra bombar querido. Porque eu sei te
ouvir, tenho uma buceta que não é de se jogar fora e te chupo como nenhuma
outra chupou. Você disse isso uma vez, lembra? Mas o mais importante não é o
sexo. É isso aqui. Essa quí-mi-ca entre a gente. Essa sensação de compreender o
outro, de saber o que ele está sentindo antes mesmo dele dizer, de se entender
só de olhar, de ficar excitada só com a tua voz, o seu cheiro. Essa coisa louca
que só o amor verdadeiro é capaz de trazer. Não, não vou te exigir que sinta o
mesmo que eu. Eu sei esperar. Amor se constrói, é um exercício de confiança, de
companheirismo. Eu só quero que você nos dê uma chance. Um tempo pra gente se
acertar, se ouvir e poder transformar esse alicerce em estrutura sólida. Falei
bonito agora, né? Então tá, tô indo pra aí. Tô levando um vinho pra comemorar
este momento. E maconha, claro. Pra abrir a mente e a percepção. Cê não acha
que a gente forma um lindo casal?
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